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terça-feira, 8 de abril de 2014

[Crítica] A 4ª Temporada de The Walking Dead


A 4ª Temporada de The Walking Dead finalmente terminou, e só agora eu resolvi pegar os episódios e assistir tudo de vez. O que eu achei? Bem, digamos que é sempre muito bom quando uma série ou filme adaptado dos quadrinhos começa a beber mais da sua fonte original. E foi o que aconteceu aqui.

Desde antes de estrear, havia sido prometido pelos produtores que esta seria a temporada em que mais veríamos cenas adaptadas da série em quadrinhos de The Walking Dead, mesmo que em situações diferentes de como ocorreu lá. E realmente cumpriram a promessa. A série, que vem tendo uma melhora visível e considerável de uma temporada para outra, finalmente acertou o ponto entre os episódios tensos, os dramas, e a ação. Considero que a quarta temporada foi a melhor até aqui, com tudo sendo muito bem trabalhado. É notório que há um cuidado muito maior na construção dos personagens, algo que até notava-se uma tentativa nas temporadas anteriores, mas que nunca era explorado com profundidade.

A temporada começou meio devagar, mostrando um Rick (Andrew Lincoln) fazendeiro cansado do peso da liderança, e um impulsivo Carl (Chandler Riggs) querendo ação e chateado em ver todos tão relaxados como se tivessem esquecido do perigo que os cerca. E o clima é realmente esse, a galera da prisão agora vive de plantar, semear e dar aula para as criancinhas. Menos Michonne (Danai Gurira), que ainda faz suas rondas à procura do Governador (David Morrisey). Nessa primeira parte temos uma ameaça pouco comum na série. Os "walkers" não são o grande foco aqui (apesar de sempre serem ameaça constante) mas sim uma doença contagiosa (fica explícito que é gripe suína) que vai aos poucos matando os personagens, e consequentemente os transformando em zumbis, levando a ameaça para o lado de dentro da prisão. Rick e cia precisam lidar com esse novo problema, enquanto seus amigos vão sendo vitimados pelo doença e contagiando outros, chegando ao ponto de precisarem ser isolados em um bloco separado da prisão. É uma trama um pouco arrastada, mas que vale a pena pela tensão criada em alguns dos episódios e por ser um arco curtinho, que é resolvido em cerca de 5 episódios.
Porque logo depois disso chegamos ao ponto que interessa e que todos estavam esperando desde o fim da terceira temporada. O Governador está de volta, bitches. And he's on fire.

Abandonado pelos seus companheiros e completamente sozinho, o vilão vagueia pelo mundo até encontrar as irmãs Tara (Alanna Masterson) e Lilly (Audrey Marie Anderson), que vivem com o velho pai moribundo e a filha pequena de Lilly, Meghan. Usando o nome falso de Brian, o Governador passa a viver com essas pessoas e por um tempo parece ter encontrado uma espécie de "redenção", se tornando responsável por elas após a morte de seu velho pai. De volta à estrada, dessa vez com as três, o Governador acaba reencontrando seu antigo comparsa que o abandonou outrora, Martinez (Jose Pablo Cantillo). Agora líder de um acampamento, Martinez aceita o mudado Brian no grupo, que inicialmente passa a levar uma vida pacata, tendo um relacionamento com Lilly e morando em um trailer com ela e Meghan. O interessante é que por um pequeno momento você chega a pensar que o Governador poderia realmente ter mudado. Aceitado a oportunidade que a vida estava lhe dando. Porém, é o Governador né, e logo seu lado obsessivo, doentio e maníaco por liderança volta à tona, e não demora muito tempo para ele se tornar o líder do acampamento, mesmo tendo que matar para isso.
Persuasivo, o Governador conta para seu povo sobre a prisão e do quanto precisam do lugar para a sua sobrevivência, os convencendo a tomá-la em um ataque liderado por ele.
E é aqui que temos uma das cenas mais fiéis aos quadrinhos dessa temporada, com a invasão do Governador à prisão, com direito até mesmo ao famoso tanque de guerra.

Em uma das cenas mais legais do episódio, há um conversa de líder para líder entre o Governador e Rick, onde utilizando Michonne e Hershell (Scott Wilson) como reféns, o vilão pede que Rick e seu grupo abandonem a prisão pacificamente prometendo não haver mortes. Um desesperado Rick tenta dialogar, oferendo abrigo a todos e dizendo que os dois grupos poderiam viver em paz, o que é imediatamente recusado pelo Governador. É interessante perceber nessa cena o nítido desespero de Rick, que fez de tudo para se distanciar da liderança do grupo criando até mesmo um conselho para isso, mas que aqui se vê obrigado a tomar as decisões novamente.
Ao ouvir a recusa do ex-policial em entregar a prisão, o Governador se enfurece e em mais uma cena adaptada dos quadrinhos corta a cabeça de Hershell com a espada de Michonne. Como prometido pelos produtores, vemos cenas dos quadrinhos não exatamente como elas aconteceram, mas ainda assim estão ali. Lembrando que na HQ quem tem a cabeça decepada pelo Governador é o Tyreese.


Após isso a guerra explode e o que se vê é uma sequência de tiro, porrada e bomba (perdoem a analogia) que acaba culminando na morte do Governador (até que enfim), na perda da prisão que é invadida por centenas de zumbis, e na fatídica separação do grupo de Rick, com cada um fugindo para um lado, da maneira que é possível.

E assim temos o final da metade da quarta temporada, que fecha com mais uma cena adaptada. A fuga de Rick e Carl, com a prisão tomada por errantes no fundo, em que Rick diz a fatídica frase: "Não olhe para trás, Carl."
A partir daqui, com o retorno da temporada após uma pausa e o fim da zona de conforto que era a prisão, a série toma um novo rumo. Completamente focada nas relações dos sobreviventes com seus companheiros, aqui vemos um tratamento digno e mais profundo em cada personagem, e para mim essa segunda metade de temporada foi melhor que a primeira. Não temos muitas cenas de ação, porém há muita tensão e luta pela sobrevivência. Um verdadeiro drama psicológico.
Foi a primeira vez em que realmente senti um vínculo e uma simpatia com cada um dos personagens. Acho que agora sim vou sofrer quando algum deles morrer, o que se tratando de The Walking Dead, sabemos que VAI acontecer.
O mote principal gira em torno de placas de aviso espalhadas pelos trilhos de um trem, prometendo um "santuário seguro para todos" que se encontra no final da linha, no Terminal ou Terminus em inglês.
Decididos a chegar nesse local, os grupos vão caminhando em busca desse santuário, o que vai criando durante a jornada a expectativa do fatídico reencontro. Um dos destaques desse arco é a aparição dos personagens Abraham, Eugene e Rosita muito bem caracterizados, parecendo terem saído diretamente das páginas dos quadrinhos. O objetivo do grupo também se mantém como o mesmo da HQ, que é levar Eugene em segurança para Washington, onde ele supostamente pode encontrar uma cura, já que alega saber como a infestação zumbi começou. O grupo se une a Glenn (Steven Yeun) temporariamente para ajudá-lo a reencontrar sua esposa Maggie (Lauren Cohan), e a dinâmica do grupo é muito boa.

Porém, a equipe mais interessante tratada nesses episódios acaba sendo a que é formada por Daryl Dixon (Norman Reedus) e Beth (Emily Kinney). Inicialmente achei que seriam os episódios mais chatos, por eu não gostar muito de Beth e o fato dela agir como uma criança mimada só piorar minha opinião.
Mas a interação de Daryl, um lobo solitário, com a infantil Beth acaba criando um clima interessante onde ambos os personagens crescem e aprendem mais um sobre o outro, sobre seus medos e suas frustrações. A cena em que Daryl chora desafogando suas mágoas abraçado por Beth é memorável e marcante.

Na verdade, não sei se foi viagem minha, mas o episódio deles dois me lembrou muito Resident Evil. A ambientação, o clima de survivor horror, e até mesmo a relação dos dois. Enfim, pode ter sido coisa da minha cabeça pelo fato de Daryl estar com o cabelo igual o do Leon e Beth se parecer fisicamente com Ashley, personagens do jogo Resident Evil 4, mas realmente me pareceu uma espécie de homenagem ao famoso jogo da Capcom. Tanto pelos cenários parecidíssimos com alguns dos jogos da série, quanto por Daryl ficar recolhendo objetos desnecessários pelo cenário como dinheiro, documentos e mapas. Também não sei se foi coisa da minha cabeça mas Daryl e Beth mostraram potencial para ser o mais novo casal da série. Pelo menos para mim ficou bem claro que o Arqueiro mais badass da TV está ficando apaixonado pela garota.

Outro ponto digno de nota nessa temporada é a evolução de Carol (Melissa McBride) como personagem. Quase não dá para lembrar da submissa esposa que apanhava do marido na primeira temporada, ou da mãe que perdeu a filha na segunda. Carol se tornou uma pessoa que faz o que for necessário pela sobrevivência do grupo, mesmo que seja tomando medidas drásticas e pouco aceitáveis pelos seus companheiros. Praticamente um Rick em versão feminina.

Expulsa do grupo pelo ex-policial ainda na primeira metade da temporada por ter feito um ato que ele considerou imperdoável, Carol acaba encontrando Tyreese (Chad Coleman), que estava sobrevivendo sozinho enquanto tomava conta das crianças Lizzie, Mica e a pequena Judith.
É mais uma interação muito boa, perdendo apenas para a de Daryl e Beth, e o episódio focado neles é sem sombra de dúvidas nesta temporada o mais denso, profundo e que realmente passa a sensação da merda que o mundo se tornou. Mostra que aquele mundo não é mais o mesmo, e portanto as definições de certo ou errado não mais existem. Para sobreviver nesse mundo é necessário tomar certas ações que antes seriam vistas como monstruosas, mas que aqui são questão de sobrevivência. Carol é a personagem que ilustra melhor na série o quanto uma situação desesperadora pode mudar drasticamente a personalidade de uma pessoa, e que todos somos capazes de nos tornarmos mais fortes mediante o desespero.

Porém, o personagem que deixa bem claro até que ponto uma pessoa de bem pode chegar para proteger os seus entes queridos ainda é o Rick. Tenho um carinho especial pelo personagem desde a fatídica noite em que li praticamente quase todas as edições de The Walking Dead de uma só vez, que foi quando ele se tornou um dos meus personagens favoritos das histórias em quadrinhos em geral. Sempre admirei o seu senso de liderança e justiça, que com o tempo foi ficando mais e mais controverso, levando ao extremo daquele velho papo de que os fins justificam os meios.
Rick não mede esforços para proteger esse grupo que praticamente depositou suas vidas em suas mãos quando o escolheram como líder. E é exatamente assim que ele se sente. Responsável por todos.
Considero que Andrew Lincoln vem fazendo um excelente trabalho na pele de Rick. Acho sensacionais as caras de maluco que ele faz revirando os olhos, algo que retrata muito bem a condição psicológica do personagem, além do ator conseguir passar muito bem essa aura de líder que o Rick precisa ter. No último episódio, ele toma sua atitude mais chocante de tudo que já fez na série, e olha que o cara já fez muita coisa bizarra. Pode-se dizer que toda a cena em si é o ápice dessa quarta temporada, com direito a muito sangue. Foi como se tudo que aconteceu durante a temporada estivesse caminhando para esse momento, tanto que inclusive são mostrados alguns flashbacks durante o episódio, mostrando o momento em que Hershell havia convencido Rick a abandonar sua Colt Python .357 Magnum (uma belíssima arma diga-se de passagem) para plantar legumes.
Aqui fica claro que não importa o que se faça, não dá mais para viver como antes. O mundo mudou, as pessoas são cruéis, e você só sobrevive sendo mais cruel do que elas. Há um diálogo entre Michonne e Carl nesse mesmo episódio que pontua muito bem essa situação, onde o garoto afirma que já se tornou um monstro.
Nos dois últimos episódios, como já era esperado, o grupo se reencontra quando finalmente chegam no misterioso Terminal, onde acabam descobrindo que nem tudo é o que parece, e aquele "santuário" não é tão seguro assim. Ao que tudo indica, na 5ª temporada teremos mais um arco adaptado dos quadrinhos, a saga dos canibais. E promete ser muito bom.


Enfim, o que me fez gostar mais dessa temporada do que das anteriores sem dúvida foram as adaptações da HQ. Sempre achei um desperdício deixarem passar tantos momentos sensacionais e marcantes dos quadrinhos e seguir um caminho tão diferente na série. Aqui finalmente souberam dosar muito bem, utilizando as adaptações quando necessário.
A série mantém a sua identidade própria, e funciona muito bem seguindo o seu próprio caminho. Tem que ser assim, porque afinal também não teria graça assistir algo que fosse uma cópia fiel do que já foi visto na série em quadrinhos. Porém, do modo como foi feito, pegando momentos clássicos da HQ e adaptando para as situações da série, tudo fluiu perfeitamente. Sinto que The Walking Dead encontrou o seu caminho, e a tendência é só melhorar.
Já me sinto ansioso pela próxima temporada. Pela primeira vez.